O meu criado polvo segurava com um tentáculo o meu casaco, e num segundo oferecia-me a minha bebida preferida com cola. Ainda com um outro braço eficaz, rodava em destreza fina o volume do som da televisão e baixava o lume ao assado.
Um final de dia perfeito, pensei.
A mulher de duas cabeças e três seios, cumprimentou-me piscando o olho direito. As crias de centauro absorviam a sua atenção. Todas três.Refastelei-me no sofá, feliz da minha vida caseira de solteiro boémio.
O plasma da sala precisava de ser limpo. O último gambuzino motard que comprei ao chinês do bairro, espatifou-se numa 125 azul contra ele, largando no celulóide um viscoso líquido amarelado e de cheiro estranho.
O polvo, a braços com uma praga de gafanhotos gigantes na cozinha, cerca de oito, não tinha mãos a medir para a ocorrência, mas logo que se viu livre do primeiro, passou um paninho no ecrã.
De repente, uma notícia chamou a minha atenção. Um padre brasileiro partira em viagem agarrado a mil balões de hélio rumo aos céus, e estava desaparecido, presumindo-se que havia caído ao mar.
Emocionei-me assim que passaram a última gravação telefónica do padre pedindo auxilio aos bombeiros para o ajudarem a perceber o GPS que tinha levado, pois precisava de enviar as coordenadas do sítio onde se prevê que tenha caído.
O polvo sempre atento, passou-me um lenço para me assoar, que nessa altura já eu chorava compulsivamente. O mesmo pano que limpou o gambuzino.
Liguei à Júlia, foi compulsivo.
Do outro lado atendeu o seu holograma.
- Estás mais magra!
Respondi aleatoriamente.
Nota ao leitor: A notícia do padre desaparecido pode parecer falsa, mas não é. Já a minha percepção da realidade das coisas é uma verdade da qual teimo em me afastar, e que ando a tratar com lampreias.
1 comentário:
Será que o Padre brasileiro desapareceu realmente? Ou terá ido fazer uma excursão maritima???? abraço. Arsénio
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